sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Teoria do ordenamento jurídico - Bobbio - HERMENÊUTICA

BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. São Paulo: Polis, 1989.


Capítulo 1 – Da norma jurídica ao ordenamento jurídico

1.             Segundo Bobbio, não é possível da uma definição do direito do ponto de vista da norma jurídica considerada isoladamente, pois uma definição satisfatória do direito só é possível se nos colocarmos do ponto de vista do ordenamento jurídico.
2.         “O termo ‘direito’, na mais comum acepção de direito objetivo, indica um tipo de sistema normativo, não um tipo de norma.” (p. 31)
3.         “O ordenamento jurídico (como todo sistema normativo) é um conjunto de normas. Essa definição geral de ordenamento pressupõe uma única condição: que não constituição de um ordenamento concorram mais normas (pelos menos duas), e que não haja ordenamento composto de uma norma só.” (p. 31)
4.         Em todo ordenamento encontramos dois tipo de normas: as de conduta – que prescrevem como a conduta deve ser – e as normas de estrutura (ou de competência) – que estabelecem as condições e os procedimentos através dos quais emanam normas de conduta válidas.
5.         Não é possível um ordenamento formado por uma única regra de conduta. Isso se deve ao fato de ser inconcebível que um ordenamento regule todas as ações possíveis com uma única modalidade normativa.
6.         Já um ordenamento com apenas uma norma de estrutura é concebível, como por exemplo na monarquia absoluta. Entretanto, “o fato de existir uma norma de estrutura tem por conseqüência a extrema variabilidade das normas de conduta no tempo, e não a exclusão de sua pluralidade em determinado tempo”. (p.35)
7.         “Se um ordenamento jurídico é composto de mais de uma norma, disso advém que os principais problemas conexos com a existência de uma ordenamento são os que nascem das relações das diversas normas entre si.” (p. 34). Daí, tem como problemas:
  • Em relação à unidade e de que modo se constituem; problema discutido pela hierarquia das normas;
  • A respeito de se o ordenamento jurídico constitui um sistema; problema das antinomias jurídicas;
  • A questão da completude do ordenamento e suas eventuais lacunas; e
  • As inter-relações entre ordenamentos diversos, o reenvio de um ordenamento a outro.


Capítulo 2 – A unidade do ordenamento jurídico

8.         “Em cada ordenamento o ponto de referência último de todas as normas é o poder originário, que dizer, poder além do qual não existe outro pelo qual se possa justificar o ordenamento jurídico. Esse é o ponto de referência necessário [..] para fundar o ordenamento jurídico. Chamamos esse poder originário é a fonte das fontes.” (p. 41)
9.         Os ordenamentos jurídicos são complexos, isto é, suas normas provêm de mais de uma fonte. A necessidade de regras de conduta humana numa sociedade é tão grande que não existe nenhum poder ou órgão em condições de satisfazê-las sozinho. Há duas razoes fundamentais para essa complexidade: a absorção de um ordenamento pré-existente e a criação de um direito novo.
10.       Fontes de direito “são os atos ou fatos dos quais o ordenamento jurídico faz depender a produção de normas jurídicas”. (p. 45)
11.       Os ordenamentos complexos operam a partir dos seguintes expedientes: a recepção de normas já feitas, produzidas por ordenamentos diversos e precedentes, e a delegação do poder de produzir normas jurídicas a poderes ou órgãos inferiores.
12.       A teoria escalonada do ordenamento jurídico de Kelsen “serve para dar uma explicação da unidade de um ordenamento jurídico complexo. Seu núcleo é que as normas de um ordenamento jurídico não estão todas num mesmo plano. Há normas superiores e normas inferiores. As inferiores dependem das superiores. Subindo das normas inferiores àquelas que se encontram mais acima, chega-se a uma norma suprema, que não depende de nenhuma outra norma superior, e sobre a qual repousa a unidade do ordenamento. [...] é a norma fundamental.[...] É ela que dá unidade ao ordenamento”. (p. 49) Todas as fontes do direito podem ser remontadas essa uma mesma norma.
13.       “Devido à presença, [...], de normas superiores e inferiores, ele [ordenamento] tem estrutura hierárquica. As normas de um ordenamento são dispostas em ordem hierárquica.” (p. 49)
14.       Ato executivo é qualquer ato no qual um indivíduo executa a obrigação contraída com outrem. O ato executivo é o cumprimento de uma regra de conduta derivada do contrato. A referência última do ato executivo são as normas constitucionais, o que o faz pertencer ao sistema normativo escalonado. São as bases da pirâmide hierárquica das normas, sendo apenas executoras (do contrato), nunca produtoras.
15.       Um processo de produção jurídica é aquele que é percebido vendo a pirâmide hierárquica de cima para baixo: o processo pelo qual as normas superiores produzem as inferiores.
16.       A produção jurídica “é a expressão de um poder (originário ou derivado), a execução é o cumprimento do dever”. (p. 51)
17.       Quando um órgão superior atribui a um órgão inferior um poder normativo, não lhe atribui poder ilimitado, estabelece limites entre os quais pode ser exercido. Os limites são de dois tipos: relativos ao conteúdo (limites materiais) e relativos à forma (limites formais). Os limites materiais referem-se ao conteúdo da norma que o inferior está autorizado a emanar, podendo ser positivo (quando impõe estabelecer normas de determinada matéria) ou negativo (quando proíbe estabelecer normas de determinada matéria). Os limites formais referem-se à forma, ao modo ou ao processo pelo qual a norma inferior deve ser emanada.
18.             “Chamam-se ‘juízos de equidade’ aqueles em que o juiz está autorizado a resolver uma controvérsia sem recorrer a uma norma legal preestabelecida. O juízo de equidade pode ser definido como autorização, ao juiz, de produzir direito fora de cada limite material imposto pelas normas superiores.” (p. 56)
19.       Para Bobbio, como já visto direito – regra formal da conduta humana – é diferente de norma. Esta é definida por ele como “imposição de obrigações (imperativo, comando, prescrição, etc.)”. (p. 58)
20.       O poder constituinte é o poder do qual derivam as normas constitucionais, o poder último, supremo, originário, num ordenamento jurídico.
21.       Uma norma jurídica pressupõe um poder jurídico. Todo poder normativo pressupõe, por sua vez, uma norma que o autoriza a produzir normas jurídicas. Dado o poder constituinte como poder último, devemos pressupor uma norma que atribua a ele a faculdade de produzir normas jurídicas. Essa norma é a norma fundamental, que atribui aos órgãos constitucionais poder de fixar normas válidas e impõe a todos aqueles aos quais se referem as normas constitucionais o dever de obedecê-las. É, então, atributiva e imperativa.
22.       A norma fundamental não está expressa, é pressuposta para fundar o sistema normativo. Isso não significa que ela não exista: a ela nos referimos como o fundamento subentendido da legitimidade de todo sistema.
23.             Podemos responder à questão sobre o modo pelo qual é estabelecida a pertinência de uma norma a um ordenamento jurídico, ou melhor, a sua validade, remontando de grau em grau, de poder em poder, até a norma fundamental. A norma fundamental é, então, o critério supremo que permite estabelecer se uma norma pertence ou não a um ordenamento, sendo o fundamento de validade de todas as normas do sistema. Quando uma norma é válida, isto é, está de acordo com o ordenamento jurídico e foi posta por autoridade competente, com poder legítimo de estabelecer normas (de onde vem esse poder? qual a norma que o autoriza? – subir de grau em grau), é obrigatório se conformar com ela.
24.             Postulados são aquelas proposições primitivas das quais se deduzem outras, mas que, por sua vez, não são dedutíveis. A norma fundamental exerce, no ordenamento jurídico, a função de postulado. Os postulados são colocados por convenção ou por evidências destes (o mesmo se pode dizer da norma fundamental).
25.       A norma fundamental não tem fundamento, porque,se tivesse, não seria mais norma fundamental.  A fundamentação da norma fundamental na é questão do direito, especulando sobre ela estaríamos saindo da teoria do direito positivo e entrando na secular discussão em torno do fundamento, ou melhor, da justificação do poder (para Bobbio,a  força). A força é a verdadeira fonte última de todo poder.
26.       O poder originário é a verdadeira fonte última de todo o poder: é o conjunto de forças políticas que num determinado momento histórico tomaram o domínio e instauraram um novo ordenamento jurídico.
27.       Quando a norma fundamental diz que se deve obedecer ao poder originário, não deve absolutamente ser interpretada no sentido de que devemos nos submeter à violência, mas no sentido de que devemos nos submeter àqueles que tem poder coercitivo.
28.       A força é um instrumento necessário para exercer o poder, mas não para justificá-lo.
29.       Além disso, a força é necessária para a realização do direito, pois coloca o poder como fundamento último de uma ordem jurídica positiva.
30.       No entanto, isso não reduz o direito à força; só demonstra que ela é um instrumento para a realização do direito.
31.       A norma fundamental está na base do direito como ele é (direito positivo), e não como deve ser (direito justo). O direito como ele é, é expressão dos mais fortes. Tanto melhor, então, que os mais fortes sejam os mais justos.
32.       Bobbio defende que a força é um instrumento para a realização do Direito. Kelsen, ao contrário, sustenta que a força é o objeto de regulamentação jurídica, isto é, que por Direito deve-se entender não um conjunto de normas se tornam válidas através da força, mas um conjunto de normas que regulam o exercício da força numa determinada sociedade.
            Quando Kelsen diz que o Direito é um ordenamento coercitivo, quer dizer que é composto por normas que regulam a coação. Kelsen assim reduziria, segundo crítica de Bobbio, o direito às normas secundárias, que podem ser definidas como aquelas que regulam o modo e a medida em que devem ser aplicadas as sanções. Essa definição se restringe ao conteúdo das normas, limitativa (para Bobbio, a juridicidade de uma norma não depende de seu conteúdo, mas simplesmente por fazer parte de ordenamento jurídico vigente, podendo ser remontada até a norma fundamental. Para Bobbio, as regras para o exercício da força são apenas aquelas ligadas à sanção, e não todas as normas.O objetivo de todo legislador, para ele, não é organizar a força, mas organizar a sociedade mediante a força.


Capítulo 3 – A coerência do ordenamento jurídico

1.         O problema tratado por Bobbio neste capítulo é se um ordenamento jurídico, além de uma unidade, constitui também um sistema, isto é, uma unidade sistemática. Um sistema é “uma totalidade ordenada, um conjunto de entes entre os quais existe uma certa ordem”.(p. 71) Esses entes não devem se relacionar apenas com o todo, como também entre si. Quando nos perguntamos se um ordenamento jurídico constitui um sistema, nos perguntamos se as normas que os compõe então num relacionamento de coerência entre si.
2.         Kelsen distingue entre os ordenamentos jurídicos dois tipos de sistema, um estático e outro dinâmico.
3.         O sistema estático é aquele no qual as normas estão relacionadas umas às outras como as proposições de um sistema dedutivo, isto é, se derivam umas das outras partindo de uma ou mais normas originárias de caráter geral, postulados ou axiomas. As leis em um sistema estático estão deduzidas de uma primeira lei geral, e, portanto, estão relacionadas entre si no que se refere ao seu conteúdo.
4.         Já o sistema dinâmico é aquele no qual as normas que o compõe derivam umas das outras através de sucessivas delegações de poder, ou seja, não através de seu conteúdo, mas através da autoridade que as colocou: uma autoridade inferior deriva de uma superior, até que se chega a uma autoridade suprema que não tem nenhuma acima de si. A relação entre essas normas não é, então, material, e sim formal.
5.             Segundo Kelsen, os ordenamentos jurídicos são sistemas dinâmicos, no qual o enquadramento das normas é julgado com base num critério meramente formal, referente à maneira como elas foram postas, independente do seu conteúdo. Um exemplo de ordenamento estático seria o ordenamento moral, no qual o enquadramento das normas é fundado sobre aquilo que elas prescrevem, e não sobre a autoridade da qual derivam.
6.         Os três significados da palavra sistema utilizados pela teoria do direito são:
  • Um primeiro significado é o mais próximo ao significado sistema na expressão ‘sistema dedutivo’. Em tal acepção, diz-se que um dado ordenamento é um sistema enquanto todas as normas jurídicas daquele ordenamento são deriváveis de alguns princípios gerais. Essa acepção foi mais usada pelos jusnaturalistas.
  • Um segundo significado é encontrado na ciência do direito moderno, do célere sistema do direito romano atual. Nesse sentido, sistema é usado para indicar um ordenamento da matéria, realizado através do processo indutivo, partindo do conteúdo das simples normas com a finalidade de construir conceitos sempre mais gerais, e classificações ou divisões da matéria inteira (semelhante a uma classificação taxonômica).
  • O terceiro é o considerado por Bobbio como o mais interessante. Diz-se que o ordenamento jurídico constitui um sistema porque não podem coexistir nele normas incompatíveis, estabelecendo uma relação entre as normas, que é a de compatibilidade. Aqui, sistema equivale à validade do principio que exclui a incompatibilidade das normas.
7.         O ordenamento jurídico constitui um sistema porque não podem coexistir nele normas incompatíveis. A tese de que o ordenamento jurídico constitua um sistema no terceiro sentido pode-se exprimir dizendo que o Direito não tolera antinomias.
8.             Antinomia é a denominação própria da situação de normas incompatíveis entre si, uma dificuldade tradicional frente à qual se encontraram os juristas de todos os tempos. Definimos como antinomia como aquela situação na qual são colocadas em existência duas normas incompatíveis, pertencentes ao mesmo ordenamento e tendo o mesmo âmbito de validade.
9.         Para que possa ocorrer antinomia são necessárias duas condições:
  • Duas normas devem pertencer ao mesmo ordenamento
  • As duas normas devem ter o mesmo âmbito de validade. Distinguem-se quanto ao âmbito de validade de uma norma: temporal, espacial, pessoal e material. Não constituem antinomia duas normas que na coincidem com respeito a: tempo, espaço, pessoa e matéria.
10.       As antinomias podem ser distinguidas em três tipos diferentes, conforme a maior ou menor extensão do contraste entre as duas normas:
·         se as duas normas incompatíveis têm igual âmbito de validade, a antinomia é total-total: em nenhum caso uma das duas normas pode ser aplicada sem entrar em conflito com a outra.
·         se as duas normas incompatíveis têm âmbito de validade em parte igual e em parte diferente, a antinomia subsiste apenas para a parte comum, e é parcial-parcial: cada uma das normas tem um campo de aplicação em conflito com a outra, e um campo de aplicação no qual o conflito não existe.
·         se, de duas normas incompatíveis, uma tem âmbito de validade igual ao da outra, porém mais restrito, isto é, seu âmbito de validade é igual a uma parte da outra,  a antinomia é total-parcial: a primeira norma não pode ser em nenhum caso aplicada sem entrar em conflito com a segunda e a segunda tem uma esfera de aplicação em que não entra em contato com a primeira.
11.       As antinomias podem ser solúveis ou insolúveis. Nem todas as antinomias são solúveis (podem ser solucionadas) pois há casos de antinomias nos quais não se pode aplicar nenhuma regra pensada para a solução das antinomias e há casos em que se podem aplicar ao mesmo tempo duas ou mais regras em conflito entre si. As antinomias insolúveis, então, são aquelas em que o intérprete da norma é abandonado a si mesmo ou pela falta de um critério para solução da antinomia ou por conflito entre os critérios dados.
12.       As regras fundamentais para a solução das antinomias são três:
  • Critério cronológico – entre duas normas incompatíveis, prevalece a norma posterior.
  • Critério hierárquico – entre duas normas incompatíveis, prevalece a hierarquicamente superior.
  • Critério da especialidade – entre duas normas incompatíveis, uma geral e uma especial (ou excepcional), prevalece a especial.
13.       No caso de um conflito no qual não se possa aplicar nenhum dos três critérios (por exemplo, entre normas incompatíveis dentro de um mesmo código), a solução geralmente é confiada à liberdade do intérprete, que tem três possibilidades: eliminar uma norma, eliminar as duas normas ou conservar as duas. No primeiro caso, a operação feita pelo juiz chama-se interpretação ab-rogante, mas é uma ab-rogação em sentido impróprio, uma vez que o juiz tem a liberdade de aplicar a norma que considerar mais compatível com o caso, mas não de expeli-la do sistema.
14.       No terceiro caso (conservar as duas) prova que é possível conservar duas normas incompatíveis em um sistema jurídico – e essa solução é a mais comum entre os intérpretes. Para isso, o juiz deve demonstrar que as normas não são incompatíveis, que a incompatibilidade é apenas aparente: ele elimina, portanto, a incompatibilidade através, por exemplo, de uma interpretação corretiva, forma de interpretação que pretende conciliar duas normas aparentemente incompatíveis para conserva-las ambas no sistema por meio de uma modificação leve ou parcial do texto.
15.       Uma antinomia de segundo grau é aquela em que não se trata mais de incompatibilidade entre normas, mas da incompatibilidade entre os critérios válidos para a solução das incompatibilidades das normas.  As antinomias de segundo grau são solúveis apenas havendo regras tradicionalmente admitidas para a solução de conflitos de critérios.
16.       Os conflitos entre critérios para a resolução das antinomias de segundo grau são:
·         Conflito entre critério hierárquico e o cronológico: quando uma norma anterior superior é antinômica em relação a uma norma posterior inferior. Se aplicar o critério hierárquico, prevalece a primeira; se aplicado o critério cronológico, prevalece a segunda. O critério hierárquico prevalece sobre o cronológico, caso contrário o critério hierárquico seria tornado vão, pois não haveria o poder das normas superiores de não serem ab-rogadas pelas inferiores.
·          Conflito entre o critério de especialidade e o cronológico: quando uma norma anterior-especial é incompatível com uma norma posterior-geral. Aplicando o critério da especialidade, dá-se preferência à primeira; aplicando-se o critério cronológico, privilegia-se a segunda.A lei geral sucessiva não tira do caminho a lei especial precedente.O critério da especialidade se sobrepõe.
·          Conflito entre o critério hierárquico e o de especialidade: quando entram em oposição os dois critérios fortes entre si, uma norma superior-geral com uma norma inferior-especial. Não há uma resposta segura. A solução dependerá do intérprete. Fazer prevalecer o critério hierárquico sempre seria barrar a adaptação da Constituição ás novas realidades.
            A incompatibilidade é, em resumo, um mal a ser eliminado, pressupondo uma regra de coerência: “num ordenamento não devem existir antinomias”. È uma espécie de conselho aos que ditam as leis, mas sujeita a falhas. A coerência não é condição de validade, mas sempre condição de justiça. Duas normas incompatíveis do mesmo nível e contemporâneas são ambas válidas, mas não serão, ao mesmo tempo, eficazes.
17.       Quando existem duas normas antinomias, ambas válidas, e, portanto, ambas aplicáveis, o ordenamento jurídico não consegue garantir nem a certeza, entendida como possibilidade, por parte do cidadão, de prever com exatidão as conseqüências jurídicas da própria conduta, nem a justiça, entendida como o igual tratamento das pessoas que pertencem à mesma categoria.




Capítulo 4 – A completude do ordenamento jurídico

1.         Por completude de um ordenamento jurídico entendemos a propriedade pela qual um ordenamento jurídico tem uma norma para regular cada caso, isto é, não há caso que não possa ser regulado com uma norma tirada do sistema. Sistema sem lacunas.
2.         Uma lacuna é a falta de uma norma ou de um critério para decidir qual norma deve ser aplicada, isto é, de uma solução.
3.         O nexo entre a coerência e a completude está em que a coerência significa a exclusão de toda a situação a qual pertençam ao sistema ambas as normas que se contradizem; a completude significa a exclusão de toda situação na qual não pertençam ao sistema nenhuma das duas normas que se contradizem. Incoerente é o sistema em que coexistem a norma que proíbe e que permite certa ação. Incompleto é o sistema no qual não existe norma (nem permitindo, nem proibindo) que regule uma ação.
4.         O dogma da completude é o princípio de que o ordenamento jurídico seja completo para fornecer ao juiz, em cada caso, uma solução sem recorrer à equidade. Por alguns é considerado como um dos aspectos salientes do positivismo jurídico.
5.         Bobbio caracteriza o fetichismo da lei como a atitude dos juristas e juízes de se ater escrupulosamente aos códigos: o código é, para o juiz, um prontuário que lhe deve servir infalivelmente e do qual não pode afastar-se.
6.         A escola que, pela primeira vez na história, criticou o dogma da completude foi a Escola do Direito Livre, que defendia que o direito estatal não é completo, está cheio de lacunas e, para preenchê-las, é necessário confiar principalmente no poder criativo do juiz, na sociologia jurídica, nas necessidades e na vida social.
7.         O espaço jurídico vazio foi o argumento utilizado pelos positivistas de estrita observância para defender a completude do direito. Dizia ele: um caso ou está regulado pelo Direito, e então é um caso jurídico ou juridicamente relevante, ou não está regulado pelo Direito, e então pertence àquela esfera de livre desenvolvimento da atividade humana, que é a esfera do juridicamente irrelevante. Assim, até onde o Direito alcança com as suas normas, evidentemente não há lacunas; onde não alcança, há espaço jurídico vazio e, portanto, não há lacunas no Direito, mas atividades indiferentes ao Direito.
8.         A norma geral exclusiva foi uma segunda teoria que procurou sustentar a completude do direito, pelo fato de que o Direito nunca falta. O raciocínio pode ser resumido assim: uma norma que regula um comportamento não só limita a regulamentação e, portanto, as conseqüências jurídicas que desta regulamentação derivam para aquela conduta, mas ao mesmo tempo exclui daquela regulamentação todos os outros comportamentos. Uma norma que proíbe fumar permite todas as outras condutas que não sejam fumar. Desta forma, todos os comportamentos não compreendidos na norma particular são regulados por uma norma geral exclusiva.
9.         A característica da norma geral inclusiva é a de regular os casos não compreendidos na norma particular, mas semelhantes a eles, de maneira idêntica, ou seja, estas normas prevêem as lacunas e estabelecem os modos de preenchimento. Assim, frente a um caso não regulamentado, utilizando a norma geral inclusiva, será resolvido de maneira idêntica ao que está regulamentado; já utilizando a norma geral exclusiva o caso será resolvido de maneira oposta.
10.       Os tipos recorrentes de lacunas são os seguintes:
  • Próprias (reais) – pertencem ao sistema, estão dentro do sistema. Existem quando há norma geral exclusiva e inclusiva e o caso não-regulamentado pode ser encaixado tanto numa quanto noutra. São solucionadas mediante as leis vigentes e completáveis pelos intérpretes.  Se há lacunas próprias, o sistema está incompleto.
  • Impróprias (ideológicas) – derivam da comparação do sistema real com o sistema ideal. Existem quando há somente norma geral exclusiva. Só é eliminada pela formulação de novas normas, e são completáveis só pelo legislador.
       Esses dois tipos designam um caso não regulamentado pelas leis vigentes num dado ordenamento jurídico.
      Existem ainda as leis subjetivas (que dependem de motivo imputável ao legislador, podendo ser voluntárias – quando o legislador deixa de propósito uma lei muito geral a ser interpretada pelo juiz – e involuntárias – quando o legislador comete um descuido) e objetivas (que dependem do desenvolvimento das relações sociais, independentemente da vontade do legislador).
      Existem ainda as praeter legem, regras muito particulares que não compreendem todos os casos que podem apresentar-se, e as intra legem, regras muitos gerais que revelam vazios que caberão ao intérprete preencher.
11.       Para se completar um ordenamento jurídico pode-se recorrer a dois métodos diferentes, chamados de heterointegração e de auto-integração. O primeiro consiste na integração operada através de recurso a ordenamentos diversos daquele que é dominante.
12.       Já a auto-integração é um método para completar o ordenamento que consiste na integração cumprida através do mesmo ordenamento, no âmbito da mesma fonte dominante, sem recorrência a outros ordenamentos e com o mínimo recurso a fontes diversas da dominante.
13.       Os métodos de heterointegração consistem no preenchimento através de ordenamentos anteriores ou outros ordenamentos estatais ou através de recurso a fontes diversas daquela que é dominante.
14.       Os métodos de auto-integração consistem em dois procedimentos: a analogia e os princípios gerais do direito.
            Entende-se por analogia o procedimento pelo qual se atribui a um caso não regulamentado a mesma disciplina que a um caso prescrito semelhante. A fórmula do raciocínio por analogia pode ser expressa assim: M é P, S é semelhante a M, portanto S é P. Destaca-se que a semelhança entre os dois casos suscetíveis a analogia seja uma semelhança relevante.
            O outro procedimento de auto-integração é a recorrência aos princípios gerais do Direito, ou seja, buscar em princípios ou normas não expressas, através da comparação de normas aparentemente diversas entre si, formuladas pelo interprete, aquilo a que comumente se chama o “espírito do sistema”

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Direito Penal - Concurso de Agentes

Ocorre o concurso de agentes quando várias pessoas concorrem para a realização de uma infração penal.

Os crimes podem ser monossubjetivos ou plurissubjetivos; os primeiros são aqueles que podem ser cometidos por um só sujeito; os segundos são os que exigem pluralidade de agentes; existem 2 espécies de concurso: necessário e eventual; cuida-se de concurso necessário no tocante aos crimes plurissubjetivos; fala-se em concurso eventual quando, podendo o delito ser praticado por uma só pessoa, é cometido por várias; no primeiro, o concurso de agentes é descrito pelo preceito primário da norma penal incriminadora, enquanto no segundo não existe essa previsão; quando a pluralidade de agentes é elemento do tipo, cada concorrente responde pelo crime, mas este só se integra quando os outros contribuem para a formação da figura típica; o princípio segundo o qual quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a ele cominadas, somente é aplicável aos casos de concurso eventual, com exclusão do concurso necessário.

Autor é o sujeito que executa a conduta expressa pelo verbo típico da figura delitiva; é o que mata, subtrai, seqüestra, etc., praticando o núcleo do tipo; é também autor quem realiza o fato por intermédio de outrem (autor mediato).

Dá-se co-autoria quando várias pessoas realizam as características do tipo; há diversos executores do tipo penal; por isso não há necessidade de aplicação do artigo 29, caput, 1ª parte, do Código Penal.

A participação dá-se quando o sujeito, não praticando atos executórios do crime, concorre de qualquer modo para a sua realização; ele não realiza conduta descrita pelo preceito primário da norma, mas realiza uma atividade que contribui para a formação do delito.

Partícipe é o agente que acede sua conduta à realização do crime, praticando atos diversos dos do autor.

Para que haja participação, são necessários os seguintes requisitos:

a) pluralidade de condutas;

b) relevância causal de cada uma;

c) liame subjetivo;

d) identificação da infração para todos os participantes.

Diz o § 2º do artigo 29 do Código Penal que, se algum dos concorrentes quis participar de crime menos grave, ser-lhe-á aplicada a pena deste; essa pena será aumentada até a metade, na hipótese de ter sido previsível o resultado mais grave; esse dispositivo cuida da hipótese de o autor principal cometer delito mais grave que o pretendido pelo partícipe.

O artigo 31 determina que o ajuste, a determinação ou instigação e o auxílio, salvo disposição em contrário, não são puníveis, se o crime não chega, pelo menos, a ser tentado; assim, são impuníveis as formas de concurso quando o delito não chega à fase de execução.

A participação pode ocorrer em qualquer das fases do iter criminis; considerada isoladamente a conduta do executor, pode acontecer inclusive antes da cogitação: caso de determinação ou induzimento; uma das conseqüências de configurar a participação partindo da relação de causalidade é a exclusão de qualquer conduta que não realize ou contribua para a produção do crime; em face disso, o fato constitui a participação deve ser cometido antes ou durante a realização do delito; se posterior, não é participação no crime anterior, mas sim delito autônomo.

Autoria incerta dá-se quando, na autoria colateral, não se apura a quem atribuir a produção do evento; a autoria é conhecida; a incerteza recai sobre quem, dentre os realizadores dos vários comportamentos, produziu o resultado.

Participação mediante omissão ocorre quando existe a obrigação de impedir o delito, que o omitente permite ou procede de forma que ele se realize; existe nela um não fazer correlatado a uma obrigação de fazer impeditiva do crime, obrigação esta ligada às formas das quais advém o dever jurídico de obstar a prática do fato.

A conivência consiste em omitir voluntariamente o fato impeditivo da prática do crime, ou a informação à autoridade pública, ou retirar-se do local onde o delito está sendo cometido, ausente o dever jurídico de agir; pode-se falar em conivência posterior à prática do crime, caso em que o sujeito, tomando conhecimento de um delito, não dá a notitia criminis à autoridade pública.

Segundo dispõe o artigo 30, não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter pessoal, salvo quando elementares ao crime; circunstâncias são dados acessórios que, agregados ao crime, têm função de aumentar ou diminuir a pena; não interferem na qualidade do crime, mas sim afetam a sua gravidade; condições pessoais são as relações do sujeito com o mundo exterior e com outras coisas, como as de estado civil, de parentesco, de profissão ou emprego; elementares são os elementos típicos do crime, dados que integram a definição da infração penal; observando que a participação de cada concorrente adere à conduta e não à pessoa dos outros participantes, estabelecem-se as seguintes regras:

1ª) não se comunicam as condições ou circunstâncias de caráter pessoal;

2ª) a circunstância objetiva não pode ser considerada no fato do partícipe se não ingressou na esfera de seu conhecimento;

3ª) as elementares comunicam-se entre os fatos cometidos pelos participantes, desde que tenham ingressado na esfera de seu conhecimento.

Assim, quando um dado é simplesmente circunstância ou condição do crime, aplicam-se as duas primeiras regras; quando é elementar (elemento específico), aplica-se a última.

Constituição Art. 5º e seus 78 incisos

TÍTULO II
DOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS
CAPÍTULO I
DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS

Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;
II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;
III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante;
IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;
V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por
dano material, moral ou à imagem;
VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício
dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas
liturgias;
VII - é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas entidades
civis e militares de internação coletiva;
VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção
filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e
recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei;
IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação,
independentemente de censura ou licença;
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas,
assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem
consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar
socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial;
XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e
das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na
forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal;
XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações
profissionais que a lei estabelecer;
XIV - é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando
necessário ao exercício profissional;
XV - é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa,
nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens;
XVI - todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público,
independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente
convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente;
XVII - é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar;
XVIII - a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de
autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento;
XIX - as associações só poderão ser compulsoriamente dissolvidas ou ter suas atividades
suspensas por decisão judicial, exigindo-se, no primeiro caso, o trânsito em julgado;
XX - ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado;
XXI - as entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para
representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente;
XXII - é garantido o direito de propriedade;
XXIII - a propriedade atenderá a sua função social;
XXIV - a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade
pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro,
ressalvados os casos previstos nesta Constituição;
XXV - no caso de iminente perigo público, a autoridade competente poderá usar de
propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização ulterior, se houver dano;
XXVI - a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela
família, não será objeto de penhora para pagamento de débitos decorrentes de sua atividade
produtiva, dispondo a lei sobre os meios de financiar o seu desenvolvimento;
XXVII - aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de
suas obras, transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar;
XXVIII - são assegurados, nos termos da lei:
a) a proteção às participações individuais em obras coletivas e à reprodução da imagem
e voz humanas, inclusive nas atividades desportivas;
b) o direito de fiscalização do aproveitamento econômico das obras que criarem ou de
que participarem aos criadores, aos intérpretes e às respectivas representações
sindicais e associativas;
XXIX - a lei assegurará aos autores de inventos industriais privilégio temporário para sua
utilização, bem como proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos
nomes de empresas e a outros signos distintivos, tendo em vista o interesse social e o
desenvolvimento tecnológico e econômico do País;
XXX - é garantido o direito de herança;
XXXI - a sucessão de bens de estrangeiros situados no País será regulada pela lei
brasileira em benefício do cônjuge ou dos filhos brasileiros, sempre que não lhes seja mais
favorável a lei pessoal do de cujus;
XXXII - o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor;
XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse
particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena
de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da
sociedade e do Estado;
XXXIV - são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas:
a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direito ou contra ilegalidade
ou abuso de poder;
b) a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e
esclarecimento de situações de interesse pessoal;
XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;
XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;
XXXVII - não haverá juízo ou tribunal de exceção;
XXXVIII - é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei,
assegurados:
a) a plenitude de defesa;
b) o sigilo das votações;
c) a soberania dos veredictos;
d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida;
XXXIX - não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal;
XL - a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu;
XLI - a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais;
XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de
reclusão, nos termos da lei;
XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da
tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como
crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo
evitá-los, se omitirem;
XLIV - constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou
militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático;
XLV - nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o
dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos
sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido;
XLVI - a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes:
a) privação ou restrição da liberdade;
b) perda de bens;
c) multa;
d) prestação social alternativa;
e) suspensão ou interdição de direitos;
XLVII - não haverá penas:
a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX;
b) de caráter perpétuo;
c) de trabalhos forçados;
d) de banimento;
e) cruéis;
XLVIII - a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do
delito, a idade e o sexo do apenado;
XLIX - é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral;
L - às presidiárias serão asseguradas condições para que possam permanecer com seus
filhos durante o período de amamentação;
LI - nenhum brasileiro será extraditado, salvo o naturalizado, em caso de crime comum,
praticado antes da naturalização, ou de comprovado envolvimento em tráfico ilícito de
entorpecentes e drogas afins, na forma da lei;
LII - não será concedida extradição de estrangeiro por crime político ou de opinião;
LIII - ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente;
LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;
LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são
assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;
LVI - são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos;
LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal
condenatória;
LVIII - o civilmente identificado não será submetido a identificação criminal, salvo nas
hipóteses previstas em lei;
LIX - será admitida ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for intentada no
prazo legal;
LX - a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da
intimidade ou o interesse social o exigirem;
LXI - ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de
autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime
propriamente militar, definidos em lei;
LXII - a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados
imediatamente ao juiz competente e à família do preso ou à pessoa por ele indicada;
LXIII - o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado,
sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado;
LXIV - o preso tem direito à identificação dos responsáveis por sua prisão ou por seu
interrogatório policial;
LXV - a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária;
LXVI - ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade
provisória, com ou sem fiança;
LXVII - não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento
voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel;
LXVIII - conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de
sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de
poder;
LXIX - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não
amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou
abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de
atribuições do Poder Público;
LXX - o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por:
a) partido político com representação no Congresso Nacional;
b) organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em
funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou
associados;
LXXI - conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora
torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas
inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania;
LXXII - conceder-se-á habeas data:
a) para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante,
constantes de registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter
público;
b) para a retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo por processo sigiloso,
judicial ou administrativo;
LXXIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato
lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade
administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo
comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência;
LXXIV - o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem
insuficiência de recursos;
LXXV - o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso
além do tempo fixado na sentença;
LXXVI - são gratuitos para os reconhecidamente pobres, na forma da lei:
a) o registro civil de nascimento;
b) a certidão de óbito;
LXXVII - são gratuitas as ações de habeas corpus e habeas data, e, na forma da lei, os
atos necessários ao exercício da cidadania.
§ 1º - As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.
§ 2º - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do
regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República
Federativa do Brasil seja parte.

Constituição Art 1º ao 4º

TÍTULO I
DOS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS
Art. 1º - A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios
e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
I - a soberania;
II - a cidadania;
III - a dignidade da pessoa humana;
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V - o pluralismo político.
Parágrafo único - Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes
eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.
Art. 2º - São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o
Judiciário.
Art. 3º - Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;
II - garantir o desenvolvimento nacional;
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e
quaisquer outras formas de discriminação.
Art. 4º - A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes
princípios:
I - independência nacional;
II - prevalência dos direitos humanos;
III - autodeterminação dos povos;
IV - não-intervenção;
V - igualdade entre os Estados;
VI - defesa da paz;
VII - solução pacífica dos conflitos;
VIII - repúdio ao terrorismo e ao racismo;
IX - cooperação entre os povos para o progresso da humanidade;
X - concessão de asilo político.
Parágrafo único - A República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política,
social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latinoamericana
de nações.